Estenose do Canal Lombar: fisiopatologia, clínica, diagnóstico e conduta

Estenose do Canal Lombar

Compartilhe:

Navegue pelo conteúdo

A estenose do canal lombar representa uma das causas mais prevalentes de dor lombar e limitação funcional em idosos, principalmente a partir da sexta década de vida. Essa condição corresponde ao estreitamento patológico do canal vertebral lombar, podendo afetar o canal central, os recessos laterais ou os forames intervertebrais. Trata-se de uma síndrome clínica de etiologia majoritariamente degenerativa, associada a alterações morfológicas progressivas que culminam na compressão de estruturas neurais e vasculares.

Fisiopatologia: compreendendo o processo degenerativo progressivo

Inicialmente, o ponto de partida fisiopatológico costuma ser a degeneração discal. Com o passar dos anos, o disco intervertebral sofre desidratação do núcleo pulposo, perda da elasticidade e redução da altura. Essa modificação biomecânica altera a distribuição de cargas na unidade funcional da coluna, promovendo sobrecarga nas articulações interfacetárias e nos ligamentos vertebrais.

Como resposta adaptativa, observa-se hipertrofia das articulações facetárias — com proliferação óssea marginal (formação de osteófitos) — e espessamento reativo do ligamento amarelo (ligamentum flavum). O ligamento espessado pode invadir o canal espinal, contribuindo diretamente para a estenose. Simultaneamente, o abaulamento ou herniação discal pode projetar-se para dentro do canal, exacerbando a compressão mecânica sobre as raízes da cauda equina.

Além da compressão anatômica direta, a patogênese envolve fatores inflamatórios e hemodinâmicos. A compressão persistente reduz o fluxo sanguíneo perineural e pode provocar isquemia transitória, que, por sua vez, desencadeia liberação de mediadores inflamatórios e dor neuropática. A soma desses mecanismos produz a sintomatologia clássica da estenose lombar: dor irradiada, claudicação neurogênica e, em casos mais graves, déficits neurológicos.

Classificação anatômica: canais afetados

A estenose pode ser:

  • Central: quando o estreitamento afeta o canal vertebral principal, comprimindo múltiplas raízes da cauda equina.
  • Lateral (ou do recesso lateral): quando há redução do espaço lateral adjacente ao canal, onde as raízes transitam.
  • Foraminal: quando o comprometimento se dá nos forames intervertebrais, por onde emergem as raízes nervosas.

Em muitos casos, os três compartimentos estão simultaneamente comprometidos.

Epidemiologia: por que o idoso é o principal alvo?

Estudos de imagem apontam que a estenose lombar pode estar presente em até 30% das pessoas com mais de 60 anos, mesmo na ausência de sintomas clínicos. Com o envelhecimento, as estruturas da coluna passam por degenerações cumulativas, o que explica a maior incidência nesse grupo etário.

Entre os principais fatores de risco, destacam-se:

  • idade avançada;
  • histórico de lombalgia crônica;
  • atividade ocupacional com sobrecarga lombar;
  • doenças osteometabólicas (como osteoartrose e osteoporose);
  • histórico de cirurgias lombares;
  • deformidades congênitas (estenose congênita ou displasia vertebral);
  • espondilolistese degenerativa ou ístmica.

Quadro clínico: quando suspeitar

A manifestação clínica mais característica da estenose do canal lombar é a claudicação neurogênica. O paciente relata dor em membros inferiores, geralmente bilateral, associada a sensação de peso, queimação, formigamento ou cansaço nas pernas, precipitados pela marcha ou ortostatismo prolongado. Ao inclinar o tronco para frente ou ao sentar-se, a dor tende a aliviar — fenômeno atribuído ao aumento transitório do espaço do canal medular.

Além disso, é comum a coexistência de lombalgia crônica de padrão mecânico, com rigidez matinal ausente ou pouco significativa. Em estágios mais avançados, déficits neurológicos motores e sensitivos podem surgir, como perda de força em quadríceps, reflexos abolidos e anestesia em “distribuição em sela”. A presença de alterações esfincterianas (incontinência urinária ou fecal) sugere compressão severa da cauda equina, o que constitui urgência neurocirúrgica.

Diagnóstico: da suspeita clínica à confirmação por imagem

O diagnóstico da estenose lombar é eminentemente clínico, mas requer confirmação por imagem. A ressonância magnética da coluna lombossacra é o exame padrão-ouro. Ela permite avaliar o grau de estenose, a integridade dos discos intervertebrais, as articulações interfacetárias e os ligamentos.

Os principais critérios radiológicos incluem:

  • Redução da área do canal vertebral central para menos de 100 mm² (estenose relativa);
  • Área inferior a 76 mm² (estenose severa);
  • Espessamento do ligamento amarelo > 4 mm;
  • Presença de osteófitos compressivos, colapso discal ou artropatia facetária grave.

A tomografia computadorizada pode ser útil nos casos em que há contraindicação à RM, especialmente para avaliar alterações ósseas com maior nitidez. Já a eletroneuromiografia pode auxiliar no diagnóstico diferencial com outras causas de radiculopatia, como neuropatias periféricas ou espondilite anquilosante.

Tratamento: da conduta conservadora à descompressão cirúrgica

A escolha terapêutica depende do impacto funcional dos sintomas, da resposta às medidas iniciais e da presença de déficits neurológicos. A primeira linha de abordagem é conservadora, principalmente em pacientes sem sinais de alarme.

As medidas incluem:

  • Fisioterapia direcionada para fortalecimento do core e reeducação postural;
  • Analgésicos e anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs);
  • Anticonvulsivantes ou antidepressivos tricíclicos para dor neuropática;
  • Modificação de atividades físicas e postura de repouso em flexão lombar.

Se o paciente não apresentar melhora após 6 a 12 semanas de tratamento conservador, ou se desenvolver agravamento dos sintomas neurológicos, considera-se a intervenção cirúrgica. O procedimento mais realizado é a laminectomia descompressiva, com ou sem artrodese, dependendo da estabilidade segmentar. A cirurgia objetiva restaurar o calibre do canal espinal, descomprimir as raízes e, quando necessário, promover fusão intervertebral.

Estudos demonstram que a cirurgia proporciona melhora significativa da dor e da função, especialmente nos casos de estenose severa e claudicação incapacitante. Contudo, a seleção criteriosa dos pacientes é essencial, pois há risco de complicações como infecção, sangramento, instabilidade iatrogênica e falha na fusão óssea.

Considerações finais para o Revalida

Ao se preparar para o Revalida, você deve dominar a abordagem da estenose lombar com base em três pilares fundamentais: conhecimento da fisiopatologia degenerativa da coluna, capacidade de integrar sinais clínicos com exames de imagem e habilidade para indicar o momento adequado de intervenção. A compreensão da claudicação neurogênica como um marcador clínico distintivo e o reconhecimento de sinais de gravidade, como disfunção esfincteriana, são cruciais tanto para a prova prática quanto para a atuação clínica futura.

Dominar esse tema é, portanto, um diferencial para o médico que deseja não apenas passar na revalidação, mas também oferecer cuidado de excelência em uma população em que a dor lombar e a limitação funcional são desafios diários.

Compartilhe:

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *